“Não vos prendais a um
jugo desigual com os infiéis; porque que sociedade tem a justiça com a
injustiça? E que comunhão tem a luz com as trevas?” (2 Co 6.14)
O texto de 2 Coríntios
6.14 nos apresenta alguns princípios que devem nortear as associações entre
cristãos e não-cristãos (fiéis e infiéis, justiça e injustiça, luz e trevas,
crentes e incrédulos, salvos e perdidos). Observemos alguns termos para uma
compreensão maior das questões aqui envolvidas.
Jugo desigual (gr. eterodzygountes). Associar
de maneira irregular ou discordante. Juntar animais que precisam de jugos
diferentes por que são de espécies diferentes (cf. Dt 22.10; Lv 19.19). O
conceito de jugo era usado em relação ao casamento e em relação aos professores
que concordavam em sua doutrina. Um casamento misto ou cooperação com alguém
que tenha pensamentos diferentes era considerado ser “jugo desigual”. Formar um
par desigual, ser posto na canga com um animal diferente. Paulo emprega o verbo
heterozygeo, que se aplica ao emparelhamento de tipos diferentes de animais em
Lv 19.19. C. K. Barrrett traduz assim: “Não deveis entrar em arreio duplo com
os descrentes”.
Incrédulos (gr. apístois). Descrente.
Sociedade (gr. metokê). Relação.
Companheirismo.
Comunhão (gr. koinonía).
Parceria, intercâmbio. Ato de participar, compartilhar por causa de interesse
comum. Ter coisas juntos ou em comum.
É importante atentar para
o fato de que o alerta feito por Paulo vai para além das relações matrimoniais.
Sobre isto Coenen e Brown comentam
A totalidade do contexto
e do argumento de 2 Co 6:14 e segs., porém, parece olhar além dos casamentos
mistos, para a idolatria e a impureza de modo geral (cf. C. K. Barret, op.
cit., 196), embora um casamento misto pudesse levar a semelhante idolatria e
impureza.
Não está aqui presente a
ideia de um cristianismo sectarista, onde todo e qualquer contato e relações
com os incrédulos fossem reprovadas. Sobre isto Paulo escreveu
Já por carta vos tenho
escrito que não vos associeis com os que se prostituem; isso não quer dizer
absolutamente com os devassos deste mundo, ou com os avarentos, ou com os
roubadores, ou com os idólatras; porque então vos seria necessário sair do
mundo. Mas, agora, escrevi que não vos associeis com aquele que, dizendo-se
irmão, for devasso, ou avarento, ou idólatra, ou maldizente, ou beberrão, ou
roubador; com o tal nem ainda comais. (1 Co 5.9-11)
Como se pode observar, a
preocupação do apóstolo Paulo é sempre com o tipo de associação, que por seu
alto grau de intimidade pode corromper a fé e a santidade do crente: “Não vos
enganeis: as más conversações corrompem os bons costumes”. (1 Co 15.33).
Coenen e Brown afirmam
que
O cristão deve permanecer
no mundo, sem, porém, tomar parte na idolatria e na impureza moral. Assim o
crente nunca deve ser culpado da fornicação (1 Co 5:9-10). Deve trazer seus
assuntos diante da igreja ao invés de levar o irmão crente aos tribunais
seculares (1 Co 6.1-6). Não deve deliberadamente entrar num casamento misto com
um descrente, mas, se, um dos cônjuges de um casamento que dantes era pagão
torna-se cristão, o casamento não deve ser dissolvido simplesmente por causa
disto, pois o crente santifica o casamento, cônjuge descrente pode ser
conquistado para Cristo (1 Co 7:12-16, 39). [...] Noutras palavras, Paulo não
defende uma separação exclusiva do mundo. Os crentes devem permanecer no mundo
procurando ganha-lo para Cristo. Não devem, no entanto, permitir que a sua fé
seja comprometida de qualquer modo, especialmente pela idolatria pagã e os seus
costumes sexuais dos pagãos. A conversão significa um rompimento com o mundo (1
Co 6.9 e segs.).
Observando o comentário
acima, mesmo que ênfase do presente estudo recaia sobre a união conjugal mista,
nunca é demais ressaltar as seguintes questões:
Com que autoridade
pastores que vivem se processando podem julgar as causas dos crentes?
Com que autoridade
pastores que aprovam o casamento de seus filhos crentes com descrentes pode
disciplinar os jovens e membros da igreja que se unem através do matrimônio da
mesma maneira?
Com que autoridade
pastores realizam casamentos mistos de crentes influentes e ricos para proibir
os de crentes pobres?
Com que autoridade
pastores que estão “intimamente” associados a políticos mundanos podem censurar
e punir os membros da igreja pelo mesmo tipo de associação promíscua?
Com que autoridade
pastores que relativizam princípios bíblicos para não perder “ovelhas”,
aprovando e realizando o casamento misto, podem continuar ensinando a Palavra
da Verdade?
Ainda tratando da associação
do crente com o infiel, a Bíblia de Estudo Pentecostal oferece o seguinte
comentário ao texto de 2 Co 6.14
Diante de Deus, há apenas
duas categorias de pessoas: as que estão em Cristo e as que não estão. [...] O
crente, portanto, não deve comunhão ou amizade íntima com o incrédulo, porque
tais relacionamentos corrompem sua comunhão com Cristo. Neste contexto estão as
sociedades nos negócios, as ordens secretas (Maçonaria), namoro e casamento com
os incrédulos. A associação entre o cristão e o incrédulo deve ser o mínimo
necessário à convivência social ou econômica, ou com o intuito de mostrar ao
incrédulo o caminho da salvação.
No Comentário Bíblico
Pentecostal do Novo Testamento lemos que:
De 1 Co 5.9 e 10 sabemos
que Paulo não está proibindo toda associação com os incrédulos, o que seria
impossível e exigiria, em suas palavras, “sair do mundo”. Paulo aparentemente
tem um tipo específico de relacionamento em mente. “Jugo desigual” (v. 14)
lembra Deuteronômio 22.10, que proibia que um boi e um burro fossem colocados
sob o mesmo jugo para lavrar a terra. Também pode ter o sentido de
“desigualdade” e se referir à proibição em Levítico 19.19 contra o cruzamento
de animais diferentes. Em ambos os casos, as leis da natureza no Antigo
Testamento eram instituídas para ensinar o princípio da separação espiritual.
Israel deveria evitar práticas e crenças que levariam o povo a adotar os modos
corruptos de seus vizinhos pagãos. Consequentemente, o que Paulo parece te em
mente aqui é a formação de relacionamentos que favoreciam o casamento de uma
pessoa crente com uma incrédula e levariam a alguma forma de transigência
espiritual com o paganismo, particularmente a idolatria. [...] Para se fazer
entender, Paulo continua fazendo cinco perguntas retóricas, que destacam como é
radicalmente antinatural e incompatível para crentes e incrédulos formarem
pares em um relacionamento íntimo. Cada uma das perguntas apresenta dois
opostos, é visivelmente absurda e espera uma negação imediata. [...] O apelo de
Paulo é essencialmente um apelo pela santidade. Como o estado especial de
Israel exigia a separação daquelas coisas que contaminam ou tornam uma pessoa
maculada diante de Deus, assim deveriam proteger sua pureza moral e espiritual
(v.17) não se tornando unidos em um relacionamento com os incrédulos. O
propósito desta separação não é ritual ou cerimonial, mas relacional – para
preservar a intimidade de sua relação com o Pai (v. 18).
Voltando a questão
específica do casamento misto, sua proibição está explícita no Antigo Testamento
(Dt 7.1-14; Nm 36.6, Ne 13.23-29), e o princípio que norteia a sua aplicação na
vida do cristão exposto nas passagens do Novo Testamento aqui comentadas.
Dessa forma, seja por
paixão, interesse financeiro ou coisas semelhantes a estas, a quebra deste princípio
poderá promover problemas no relacionamento do casal e na educação de seus
filhos, que poderão ter uma séria crise de identidade, vivendo sob o dilema de
seguir a fé cristã piedosa de um dos pais, ou a crença na religião, no ateísmo
ou ceticismo do outro.
Que a Bíblia continue
sendo a nossa única regra de fé. Nem os nossos sentimentos, muito menos a
pressão cultural que a igreja sofre, deve nos remover de tão sólido fundamento.
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